Por
Gleydson Mendes *
Há alguns dias um amigo nos
questionou sobre a legalidade da proposta de um vereador de sua cidade, que
apresentou um projeto de “lei municipal” para obrigar os condutores das
cinquentinhas a utilizar o capacete. O nosso questionamento imediato foi: Ele
vai criar uma lei que já existe?
Esclarecendo a dúvida do amigo,
faz-se necessário, antes de tudo, explicarmos o conceito de “cinquentinha”. O
Anexo I do CTB, que trata dos conceitos e definições, deixa bem claro que o ciclomotor é um “veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de combustão
interna, cuja cilindrada não exceda a cinqüenta centímetros cúbicos (3,05
polegadas cúbicas) e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a
cinqüenta quilômetros por hora”. Portanto, devemos entender que a famosa
“cinquentinha” para todos os efeitos legais é um ciclomotor.
Normalmente existem três
questionamentos básicos que são feitos sobre o ciclomotor (cinquentinha).
Veremos cada um deles abaixo:
É
obrigatório o uso de capacete pelos condutores dos ciclomotores?
O Código de Trânsito Brasileiro
estabelece:
Art. 54. Os condutores de
motocicletas, motonetas e ciclomotores só poderão circular nas vias:
I - utilizando capacete de segurança,
com viseira ou óculos protetores;
[...]
Art. 55. Os passageiros de
motocicletas, motonetas e ciclomotores só poderão ser transportados:
I - utilizando capacete de
segurança;
Para aqueles que desrespeitam a
norma, existe punição prevista no CTB:
Art. 244. Conduzir motocicleta,
motoneta e ciclomotor:
I - sem usar capacete de segurança
com viseira ou óculos de proteção e vestuário de acordo com as normas e
especificações aprovadas pelo CONTRAN;
II - transportando passageiro sem o
capacete de segurança, na forma estabelecida no inciso anterior;
[...]
Infração – gravíssima (7 pontos);
Penalidade - multa (R$191,54) e
suspensão do direito de dirigir (de 1 a 3 meses);
Medida administrativa - Recolhimento
do documento de habilitação;
É
obrigatório possuir habilitação para conduzir o ciclomotor?
Sim. Para conduzir o ciclomotor é
necessário ser habilitado na categoria “A” ou possuir “ACC” (Autorização para Conduzir
Ciclomotor). O processo de habilitação previsto para obtenção de tal autorização é idêntico a qualquer outro processo de habilitação, ou seja, deverão
ser feitos os exames no Detran, as aulas no Centro de Formação de Condutores
(autoescola) e a avaliação por meio de exames teóricos e práticos. A única
peculiaridade do processo de obtenção da ACC é que as aulas práticas serão
realizadas no ciclomotor, assim como o exame prático final (Resolução 168/2004 do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN).
É muito comum questionarem também
se o menor de idade pode conduzir um ciclomotor ou obter a ACC. O artigo 2º da
Res. 168/2004 do CONTRAN deixa bem claro,
assim como o artigo 140 do CTB, que para obter o documento é necessário ser penalmente imputável. O artigo 27 do
Código Penal estabelece que os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis.
Sendo assim, o menor de idade não pode conduzir ciclomotor.
Os
ciclomotores precisam ser emplacados (registrados e licenciados)?
Vejamos mais uma vez o que diz o
Código de Trânsito Brasileiro sobre o tema:
Art. 129. O registro e o licenciamento dos
veículos de propulsão humana, dos ciclomotores e dos veículos de tração
animal obedecerão à regulamentação estabelecida em legislação municipal do
domicílio ou residência de seus proprietários.
Portanto, existe sim a
obrigatoriedade do registro e licenciamento, mas ficará a cargo do município. Poucos
são os municípios do país que regulamentaram o registro e licenciamento dos
ciclomotores.
Esse descaso traz uma grave
consequência: a falta de registro limita de forma considerável o alcance da
fiscalização, que não dispõe de nenhum outro sistema de identificação veicular
que não seja a placa do veículo, impossibilitando, na imensa maioria das vezes,
a punição adequada do condutor infrator.
A ausência de placa de
identificação não impede por completo a fiscalização. Aquele que entregar o veículo a condutor menor de idade poderá
responder na esfera criminal, independentemente do veículo estar ou não
registrado. É possível também, reparar um possível dano na esfera cível, se for o
caso.
Por fim, reforçando aquilo que foi
tratado no início do texto, fica claro que o Código de Trânsito Brasileiro já obriga o uso do capacete e o suposto
projeto de lei esbarra ainda num dispositivo da Constituição Federal que diz:
Art. 22. Compete privativamente à
União legislar sobre:
[...]
XI - trânsito e transporte;
Caro amigo, espero que os
principais pontos de nossa conversa tenham sido abordados e esclarecidos. Só
nos resta aguardar e torcer para que os esforços em criar uma lei que já existe
sejam convertidos numa ampliação da educação para o trânsito e na fiscalização
contínua e eficiente.
Como sugestão ao nobre parlamentar
do seu município, que está tão empenhado em organizar o trânsito de sua cidade,
que o faça propondo juntamente com a municipalização do trânsito, a regulamentação do
registro e licenciamento dos ciclomotores. Dessa forma, entregará aos
órgãos competentes um importante instrumento para fiscalização do trânsito, em
defesa da vida humana.
* Gleydson Mendes é
instrutor do SEST SENAT e ministra aulas de legislação de trânsito em cursos
especializados na área. É criador e colaborador do blog Sala de Trânsito e
autor do livro Noções Básicas de Legislação de Trânsito.